Presidente brasileiro desembarca em Paris com agenda de sintonia com francês em temas como reforma da ONU e guerra em Gaza. Mas também uma persistente pedra no sapato: a rejeição francesa ao acordo Mercosul-UE.
O presidente Lula desembarcou em Paris nesta quarta-feira (4) para uma visita à França, marcando um novo capítulo na sintonia pessoal com o líder francês, Emmanuel Macron. Ambos demonstram afinidades em temas de defesa, mas diferenças aparentemente irreconciliáveis em livre-comércio.
A viagem também marca a primeira visita de Estado de um presidente brasileiro à França em 13 anos — a última foi realizada por Dilma Rousseff, em 2012. Essa será a oitava vez que Macron e Lula se encontram desde 2021.
O primeiro encontro ocorreu quando o petista ainda nem sequer havia voltado à Presidência. Na ocasião, Lula foi recebido com honras em Paris por Macron, num claro gesto de desafio do francês a Jair Bolsonaro, com quem mantinha uma relação hostil. Após o retorno de Lula ao Planalto, o petista e Macron ainda se encontrariam em cúpulas e conferências internacionais.
Em março de 2024, o bom relacionamento pessoal entre os dois culminou na visita oficial do líder europeu ao Brasil. Fotos que registraram momentos descontraídos entre os dois na Amazônia chegaram a virar memes nas redes sociais.
Alguns jornais franceses classificaram de maneira bem-humorada o vínculo entre os líderes como um “bromance” – termo em inglês que mistura as palavras brother (irmão) e romance, e é usado para definir amizades próximas entre homens.
Nesta semana, antes da visita de Estado de Lula, Macron divulgou uma mensagem nas redes sociais que indica a continuidade do estreitamento de laços. “Caro Lula, vamos escrever a próxima página juntos?”, escreveu Macron na publicação.
A sintonia não é meramente pessoal. Desde o retorno de Lula ao governo em 2023, a França e o Brasil passaram a compartilhar posições similares em temas como a reforma de organismos internacionais, críticas às ações militares de Israel em Gaza, regulação das redes sociais e ações para frear o avanço da extrema direita.
No entanto, apesar do “bromance”, Lula e Macron demonstram discordâncias em alguns temas. Um deles é a guerra na Ucrânia. Mas a principal pedra no sapato é o acordo de livre-comércio entre a União Europeia e o Mercosul, reforçado ainda pela Lei Antidesmatamento da União Europeia.
E, em contraste com o encontro de março de 2024, a visita de Lula à França ocorre em um momento de enfraquecimento interno dos dois líderes em seus respectivos países.
Em junho de 2024, Macron viu sua aposta em eleições legislativas antecipadas sair pela culatra com o encolhimento de sua base parlamentar. Já Lula vem lidando com dificuldades crescentes para fazer avançar sua agenda no Congresso, além de ter visto sua reprovação aumentar desde o início de 2024.
Reforma do Conselho de Segurança
Uma das prioridades da agenda externa de Lula é a ampliação do Conselho de Segurança das Nações Unidas, cuja composição permanece inalterada há mais de sete décadas, incluindo apenas as principais potências vencedoras da Segunda Guerra Mundial: EUA, Rússia, China, França e Reino Unido.
Em 2005, Brasil, Alemanha, Japão e Índia formularam em conjunto uma proposta para ampliar o conselho com seis novos membros permanentes, incluindo os quatro membros do grupo, conhecido como G4, e duas cadeiras para países africanos.
A França, na posição privilegiada de membro permanente, defende desde os anos 2000 as aspirações do G4. Macron reforçou o apoio no último discurso na Assembleia Geral das Nações Unidas, em 2024. O francês quer ir além da ampliação e também defendeu uma limitação do poder de veto dos membros permanentes para casos de crimes ou massacres.
Nos últimos anos, tanto Lula quanto Macron demonstraram exasperação pública em relação à paralisia do conselho e sua inabilidade em lidar com crises.