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Governo finalmente apresenta cortes de gastos, mas novela continua: veja os próximos passos para aprovar pacote

Governo inclui isenção de IR até R$ 5 mil. Quem ganha acima de R$ 50 mil pagaria mais

Após um mês de intensas discussões dentro do governo, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, convocou ontem rede nacional de rádio e televisão e anunciou as medidas de cortes de gastos em um pronunciamento de sete minutos.

Sem dar detalhes (o que será feito hoje) em muitas ações, ele afirmou que o pacote consolida o compromisso da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva com a “sustentabilidade fiscal do país” e que o objetivo é economizar R$ 70 bilhões até 2026, quando termina a atual gestão.

Por decisão de Lula, porém, o governo incluiu no pacote a isenção do Imposto de Renda (IR) para quem ganha até R$ 5 mil por ano, como antecipou O GLOBO, e aumento de tributos para quem ganha acima de R$ 50 mil mensais. A surpresa com a medida azedou o humor do mercado, e o dólar fechou na maior cotação nominal desde o Plano Real, negociado a R$ 5,91.

Nas primeiras análises após o anúncio do pacote, economistas avaliaram que o impacto nas contas do governo poderá ficar aquém do necessário para um ajuste de longo prazo.

Haddad disse que haverá alterações nas regras de reajuste do salário mínimo, no abono salarial, na aposentadoria dos militares, além de um pente-fino em programas sociais. O aumento da faixa de isenção do IR foi uma contrapartida a propostas com potencial de desagradar a base petista.

Bola passa para o Congresso

O ministro enfatizou que não haverá impacto fiscal com a iniciativa. Mas tudo depende agora do Congresso para sair do papel. Lula e Haddad mostraram os planos para os presidentes da Câmara e do Senado antes do anúncio do pacote, mas, mesmo com a promessa de empenho deles, a votação deve ficar para 2025.

A equipe econômica deve apresentar hoje as propostas de emenda à Constituição para concretizar o pacote. O desafio será aprovar as medidas nas duas Casas do Congresso.

As mudanças no Imposto de Renda, informou a colunista Míriam Leitão, tramitarão separadamente, em projeto de lei complementar, e só devem valer em 2026.

O impacto previsto é na casa de R$ 35 bilhões por ano. O modelo prevê que apenas quem recebe efetivamente até R$ 5 mil terá o desconto, sem haver transbordo para outras faixas do IR.

Alíquota de 10%

O ministro queria deixar o anúncio dessa medida apenas para 2025 e chegou a dizer isso em reuniões. Num encontro na segunda-feira — do qual participou o futuro presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo —, porém, Lula bateu o martelo e incluiu o anúncio do IR. Nessa mesma reunião, decidiu-se que Haddad faria um pronunciamento na TV para falar das medidas.

Venceu a perspectiva política de que todos seriam atingidos — por isso, haverá medidas para militares e sobre supersalários de funcionários públicos. Naquele momento, a Fazenda já sabia que as medidas teriam impacto negativo no mercado.

Para um técnico da Fazenda, grande parte da reação do mercado se deveu a um “mau entendimento” sobre a medida, como se os cortes de gastos fossem feitos para compensar o IR, quando o aumento do imposto terá esse objetivo.

— A nova medida não trará impacto fiscal, ou seja, não aumentará os gastos do governo. Porque quem tem renda superior a R$ 50 mil por mês pagará um pouco mais. Tudo sem excessos e respeitando padrões internacionais consagrados — disse Haddad.

O governo vai propor ao Congresso uma alíquota efetiva de 10% para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês.

Será um imposto mínimo que vai mirar a alíquota efetiva de pessoas físicas com rendimentos acima desse teto. Hoje, um contribuinte pode pagar menos de 10% de imposto mesmo se o IRPF para rendimentos dessa faixa tenha um percentual nominal de até 27,5%.

Se uma pessoa paga, na prática, alíquota efetiva de 5%, precisará pagar mais 5 pontos percentuais para chegar aos 10%.

O cálculo da alíquota efetiva considerará todos os tipos de renda da pessoa física, inclusive as hoje tributadas exclusivamente na fonte e isentas. Isso inclui dividendos.

Fim da ‘morte ficta’

Num exemplo hipotético, um trabalhador que tem rendimentos de carteira assinada e dividendos irá somar as duas rendas e calcular o seu IR efetivo para saber se precisar pagar o adicional. Isso é feito na declaração de ajuste anual do IRPF.

A deputados, Haddad disse que o projeto que tratará do assunto irá prever algum fator de redução para renda anual de R$ 600 mil a R$ 1,2 milhão — mas isso não houve detalhes. Isso significaria, na prática, pagar uma alíquota menor do que 10%.

A isenção de Imposto de Renda para quem ganha até R$ 5 mil por mês será limitada a quem efetivamente ganha até esse valor por mês. mas haverá uma rampa para beneficiar, em menor grau, aqueles que recebem até R$ 7,5 mil. Acima desse valor, seguem as regras atuais.

O chefe da área econômica iniciou o pronunciamento listando iniciativas implantadas pelo governo Lula desde a posse em 2023, como a retomada do Minha Casa, Minha Vida e o lançamento do Pé-de-Meia, que paga bolsas a alunos do ensino médio.

Destacou o crescimento do PIB superior a 3% e a redução do desemprego. Afirmou também que o combate a privilégios e sonegação permitiu melhora das contas públicas.

— Mas sabemos que persistem grandes desafios. Diante do cenário externo, com conflitos armados e guerras comerciais, precisamos cuidar ainda mais da nossa casa. É por isso que estamos adotando as medidas necessárias para proteger a nossa economia — disse.

Impacto do salário mínimo

Ao tratar da trava que vai limitar a alta real do mínimo, medida vista com maior potencial de desgaste popular, Haddad disse que os ganhos acima da inflação vão permanecer e lembrou que na gestão de Jair Bolsonaro esse “direito” não existia. Sobre o pente-fino nos programas sociais, foi sucinto:

— Para garantir que as políticas públicas cheguem a quem realmente necessita, vamos aperfeiçoar os mecanismos de controle que foram desmontados no período anterior. Fraudes e distorções atrasam o atendimento a quem mais precisa.

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