Mesmo com pendência jurídica resolvida, governo alega desacato e não libera pagamento.
Com o argumento de que a Assembleia Nacional (AN) venezuelana, há um ano controlada pela oposição, cometeu desacato ao não afastar três deputados do estado do Amazonas cujas eleições foram anuladas pela Justiça, há sete meses o Ministério das Finanças não autoriza o pagamento dos salários dos deputados. A delicada situação que vivem os congressistas foi denunciada pelo novo presidente da AN, Julio Borges, que ontem voltou a acusar o presidente Nicolás Maduro de estar à frente “de uma ditadura”.
O caso dos três deputados do Amazonas, que pertencem à Mesa de Unidade Democrática (MUD), é a base do argumento do chavismo para referir-se à atual AN como “ilegal e ilegítima”. Apesar de os congressistas em questão terem decidido abandonar suas cadeiras há cerca de dois meses e sequer estivessem presentes na cerimônia de posse das novas autoridades da AN, o governo insiste em manter os pagamentos suspensos.
— Nos próximos dias, devemos votar uma resolução confirmando o afastamento dos três deputados e, com isso, o governo não terá mais argumento para não pagar nossos salários — explicou ao GLOBO José Guerra, deputado da MUD.
Ex-economista-chefe do Banco Central da Venezuela (BCV), Guerra vive graças a uma pensão de ex-funcionário. Mas a maioria de seus colegas, comentou, “depende da ajuda financeira de seus partidos”.
— Ganhamos um salário inferior a US$ 100 e um bônus de alimentação que, esse sim, continuamos recebendo. Querem afetar nosso moral, querem nos derrotar com este tipo de iniciativas covardes — acusou.
Parlamentares da oficialista autoproclamada bancada patriótica apresentaram um recurso ao Tribunal Supremo de Justiça, em clara sintonia com o Palácio de Miraflores, pedindo o não reconhecimento das novas autoridades do Parlamento.
— Este recurso é produto do que vimos ontem (anteontem). Um discurso violento e inconstitucional por parte do candidato presidencial (em referência a Borges) — declarou o deputado chavista Héctor Rodríguez, chefe da bancada de Maduro.
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Os próximos dias serão intensos no Parlamento venezuelano. A intenção de Borges e da MUD é votar o abandono de poder por parte do presidente na próxima segunda-feira. A iniciativa não terá impacto na prática, mas significará o primeiro passo da oposição em sua luta por pressionar o chefe de Estado a convocar eleições gerais em 2017.
— Nosso objetivo este ano é que o povo seja o protagonista, que possa decidir se quer novos governadores e novo presidente — assegurou o novo presidente da AN.
A MUD mantém firme a decisão de não retornar ao diálogo com o Executivo. A estratégia da oposição é convocar marchas e redobrar a pressão a Maduro no Parlamento e nas ruas.