Países assinaram 37 acordos em setores diversos na quarta-feira durante visita de Estado de Xi Jinping; líder chinês refere-se a Lula como ‘um bom amigo com opiniões semelhantes’
O Brasil assinou 37 acordos com a China durante a aguardada visita de Estado do presidente Xi Jinping, na quarta-feira. Os documentos contemplam setores diversos — de produção agrícola a intercâmbio educacional e cooperação tecnológica —, mas não incluem a adesão à iniciativa Cinturão e Rota, o programa trilionário de investimento chinês. Em vez disso, citam um protocolo sobre “sinergias”, como já havia antecipado ao GLOBO o assessor especial de Lula para assuntos internacionais, Celso Amorim. Pequim é o maior parceiro comercial do Brasil desde 2009, mas a relação estratégica entre os países não se limita aos negócios.
Xi refere-se ao presidente brasileiro como “um bom amigo com opiniões semelhantes”, enquanto Lula não esconde o entusiasmo ao encontrar o líder chinês. Na cúpula de líderes do G20, realizada esta semana no Rio, Lula não hesitou em puxar seu homólogo para um abraço caloroso depois de lhe dar um forte aperto de mão e trocar sorrisos na rampa do Museu de Arte Moderna (MAM).
— O que a China e o Brasil fizerem juntos repercutirá em todo o mundo — disse Lula ao lado de Xi após a assinatura dos acordos em Brasília, na quarta-feira.
Xi acrescentou:
— Concordamos que esse relacionamento está no seu melhor momento histórico.
Lula fez da China uma prioridade em cada um de seus três mandatos como presidente do Brasil. Prova disto é que Pequim foi o primeiro destino do líder brasileiro fora das Américas após retornar à Presidência em 2023, e acordos alinhavados durante a visita foram estimados em até R$ 50 bilhões, após um período de distanciamento entre os países durante o governo de Jair Bolsonaro.
Já a visita de Xi esta semana é a terceira dele ao Brasil como presidente da China. Ele e Lula têm interesses pessoais em demonstrar solidariedade entre si e se beneficiam ao tratar o outro como um parceiro confiável.
— Há uma afinidade natural na forma como o Brasil, especialmente Lula, e a China veem o mundo — disse ao Wall Stret Journal Jason Marczak, especialista em América Latina no Atlantic Council em Washington.
Segundo Marczak, o Brasil quer “uma diversificação de parceiros” e, com o retorno de Donald Trump à Casa Branca, a China precisa de alternativas aos EUA.
Como Lula disse em agosto, por ocasião do aniversário de 50 anos das relações diplomáticas entre os dois países, “os laços Brasil-China são cada vez mais importantes para a construção da ordem multipolar”.
— Eu não subestimaria a química entre Xi e Lula — disse Ryan Berg, diretor do programa das Américas no Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais de Washington ao Wall Street Journal.
Brasil e China são membros fundadores do Brics, o bloco de nações em desenvolvimento que condena o domínio do dólar nas negociações globais e tem feito esforços para usar outras unidades de comércio, incluindo estudos para criar uma moeda própria. Ambos também defendem um sistema internacional mais justo e ambientalmente sustentável, e têm entendimentos comuns para a crise na Ucrânia.
— Em um mundo assolado por conflitos armados e tensões geopolíticas, China e Brasil colocam a paz, a diplomacia e o diálogo em primeiro lugar — declarou Lula na quarta-feira. — Os “Entendimentos Comuns entre o Brasil e a China para uma Resolução Política para a Crise na Ucrânia” são exemplos da convergência de visões em matéria de segurança internacional. Jamais venceremos o flagelo da fome em meio à insensatez das guerras.
Por sua vez, o presidente chinês afirmou que, só quando o mundo abraçar a segurança comum, irá trilhar um caminho da segurança universal.
— Sobre a crise na Ucrânia, não existe solução simples para um assunto tão complexo. China e Brasil emitiram os “Entendimentos Comuns entre o Brasil e a China para uma Resolução Política para a Crise na Ucrânia” e criamos o grupo de amigos da paz, com os outros amigos do Sul Global para viabilizar uma solução. Devemos reunir mais vozes que advoguem a paz.
O jogo que está sobre o tabuleiro, porém, pode mudar com uma esperada aproximação de Donald Trump com o russo Vladimir Putin. Lula e Xi defendem o diálogo, e a negociação será levada ao Conselho de Segurança da ONU. Já Trump prometeu acabar com o conflito rapidamente e o mais provável é que ele retire recursos americanos investidos na guerra. Para a Ucrânia, atualmente, Brasília e Pequim não são atores neutros.