Rede sociais acionaram a Justiça Federal da Flórida com o objetivo de barrar ordens para a remoção de perfis de bolsonaristas
Uma ação judicial movida por uma empresa ligada ao presidente dos EUA, Donald Trump, contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes está empacada há um mês porque a Justiça americana ainda não intimou o magistrado. Nesse meio-tempo, o governo Trump anunciou o tarifaço de 50% sobre exportações brasileiras e aplicou sanções a Moraes, justificando-as por supostas perseguições a adversários políticos.
No processo em questão, duas empresas de tecnologia americanas, a Trump Media — dona da rede social Truth Social — e a Rumble acionaram a Justiça Federal da Flórida com o objetivo de barrar ordens de Moraes para a remoção de perfis de bolsonaristas nas respectivas plataformas. No desenrolar do caso, outras partes se juntaram à ação e provocaram o tribunal com pedidos de investigação contra Moraes com base na Lei Magnitsky, aplicada no fim de julho pelo governo Trump.
O GLOBO apurou, no entanto, que Moraes sequer foi formalmente intimado na ação, o que levou a juíza Mary S. Scriven, do Middle District Court da Flórida, a barrar novas movimentações no processo. O pedido de intimação ao ministro foi apresentado pela Trump Media e pela Rumble no dia 8 de julho. O local indicado para a citação foi o endereço residencial de Moraes, no Jardim Europa, em São Paulo.
Partes com acesso ao processo afirmam que o ministro do Supremo não foi localizado pela Corte americana. Em nota enviada ao GLOBO, os advogados do Rumble afirmam que “seguem insistindo, por todos os meios legais, convidando Moraes a se manifestar” no caso. Procurado através da assessoria do STF, Moraes não respondeu. Ele não tem advogado constituído no processo movido na Flórida, uma vez que ainda não foi citado. No mês passado, a Advocacia-Geral da União (AGU) afirmou que acompanha o processo movido contra o ministro e que prepara documentos para fazer a defesa do magistrado, caso isso seja solicitado.
Decreto impõe sanções
Em sua petição inicial, de fevereiro deste ano, a Trump Media e a Rumble saíram em defesa do blogueiro Allan dos Santos, que está foragido nos EUA desde 2021. As plataformas buscaram barrar decisões de Moraes que tentavam suspender suas contas em redes sociais.
O pedido das plataformas se baseou num decreto assinado por Trump, dias antes, que impôs sanções contra o Tribunal Penal Internacional por tentar “impor sua jurisdição” aos EUA “sem base legal”. As empresas argumentaram que a mesma lógica deveria ser aplicada aos despachos de Moraes, quando atingirem publicações e perfis em redes sociais de pessoas baseadas nos EUA.
“O decreto sublinha o compromisso inequívoco do governo dos EUA de proteger seus cidadãos, entidades e aliados de ordens judiciais estrangeiras ilegítimas”, diz a petição da Rumble e da Trump Media.
Em nova intervenção, no início de julho, as duas empresas voltaram a se insurgir contra decisões de Moraes pelo bloqueio de contas do jornalista Rodrigo Constantino, que também vive nos EUA. Na sequência, protocolaram o pedido de intimação a Moraes, que teria 21 dias para apresentar defesa após ser oficialmente notificado — o que ainda não ocorreu. O pedido de intimação foi publicado pelo tribunal da Flórida na véspera do anúncio do tarifaço por Trump, que ocorreu no dia 9 de julho.
No desenrolar do caso, outros personagens pleitearam se juntar ao processo como “amicus curiae”, termo jurídico que se refere a terceiros com algum interesse no assunto. Um desses pedidos foi formulado há cerca de duas semanas pela Legal Help 4 You, entidade ligada a Rogerio Scotton, brasileiro que reside nos EUA.
A petição, assinada por Scotton, pediu que Moraes fosse investigado pelo governo dos EUA no âmbito da Lei Magnitsky e do “Torture Act”, por supostas violações a direitos humanos e à liberdade de expressão. Na semana seguinte, o Departamento de Tesouro dos EUA anunciou a inclusão de Moraes na lista de sancionados da Lei Magnitsky, que restringe o acesso ao sistema financeiro e a serviços prestados por empresas americanas.
Procurado pelo GLOBO, Scotton afirmou que a dificuldade de intimar Moraes levou a juíza responsável pelo caso a suspender, no início deste mês, a análise de novas petições juntadas ao processo. Diante do impasse, ele protocolou nesta semana uma ação judicial separada contra Moraes, também na Justiça da Flórida, em que pede uma investigação criminal do governo americano sobre o ministro do STF.
Nos autos da ação movida pela Trump Media e pela Rumble, a entidade representada por Scotton pediu à juíza do caso que preserve as informações já anexadas ao processo, para que sejam analisadas quando Moraes for notificado. Além disso, a entidade notificou o tribunal, em 1º de agosto, sobre novas informações alusivas ao ministro, com base no noticiário brasileiro.
Um dos elementos levados por Scotton à Corte foi a presença de Moraes num jogo de futebol do Corinthians, no mesmo dia em que foi alvo de sanções de Trump. Na petição à Justiça, Scotton citou registros fotográficos da imprensa em que o ministro aparece fazendo gesto obsceno, e associou a cena ao caso.